Papa Francisco morre aos 88 anos

Pontífice argentino que marcou uma era de reformas e acolhimento falece aos 88 anos no Vaticano
Morreu nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, o papa Francisco, primeiro pontífice latino-americano e o primeiro jesuíta a assumir o trono de Pedro. O falecimento ocorreu às 2h35 (horário de Brasília), 7h35 em Roma, conforme confirmado pelo Vaticano.
Após quase doze anos à frente da Igreja Católica, Jorge Mario Bergoglio encerra um papado marcado por profundas transformações, simbolismo e uma incansável defesa dos pobres e marginalizados.
O fim de uma era marcada pela simplicidade
Francisco vinha enfrentando um estado de saúde delicado desde o início do ano. Recentemente, tratava uma pneumonia bilateral que o deixou internado por cerca de 40 dias no hospital Gemelli, em Roma. Apesar de ter recebido alta há pouco mais de um mês, o papa continuava sob acompanhamento médico e já demonstrava dificuldade até mesmo para discursar em compromissos públicos.
“Francisco retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja”, declarou o Vaticano em nota oficial. “Ele nos ensinou a viver os valores do Evangelho com fidelidade, coragem e amor universal.”
De Buenos Aires ao Vaticano: a trajetória de um papa improvável
Nascido em 17 de dezembro de 1936, em Buenos Aires, na Argentina, filho de imigrantes italianos, Jorge Mario Bergoglio se formou técnico químico antes de seguir a vocação religiosa. Foi ordenado sacerdote em 1969 e, rapidamente, se destacou no seio da Companhia de Jesus, a ordem jesuíta. De temperamento reservado, era conhecido por sua vida modesta e dedicação ao ensino.
Antes de ser eleito papa, ocupou diversos cargos de relevância na Igreja argentina. Foi arcebispo de Buenos Aires e presidente da Conferência Episcopal da Argentina. Em 2001, foi nomeado cardeal por João Paulo II. Ao longo de sua vida, construiu uma reputação de líder intelectual, mas acessível, avesso ao luxo e defensor ferrenho da justiça social.
A eleição que surpreendeu o mundo
Em 13 de março de 2013, após a histórica renúncia de Bento XVI, Bergoglio foi eleito papa durante o segundo dia do conclave. Segundo ele próprio, assumiu o cargo contrariado: “Não queria ser papa, mas aceitei como um chamado”.
Sua escolha foi um marco: primeiro latino-americano, primeiro jesuíta e primeiro papa da era moderna a suceder um pontífice ainda vivo. A decisão dos cardeais refletia a busca por renovação em meio à crise moral e institucional enfrentada pela Igreja.
Francisco e a revolução silenciosa no Vaticano
Desde os primeiros dias de seu pontificado, Francisco sinalizou que seguiria um caminho diferente. Escolheu o nome em homenagem a São Francisco de Assis, padroeiro dos pobres, deixando claro o foco de sua missão. Seu lema papal, “Miserando atque eligendo” – “Olhou-o com misericórdia e o escolheu” – norteou suas ações.
Francisco promoveu reformas significativas na Cúria Romana, especialmente nas áreas administrativa e financeira. Cortou privilégios, combateu irregularidades no banco do Vaticano e procurou devolver à Igreja a credibilidade abalada por escândalos.
Uma voz ativa diante das injustiças globais
O pontífice não hesitou em se posicionar sobre temas políticos e sociais. Criticou líderes mundiais envolvidos em guerras, como Vladimir Putin e Benjamin Netanyahu, e alertou para a omissão diante da crise dos refugiados na Europa. Também fez história ao rezar sozinho na Praça de São Pedro durante a pandemia de Covid-19, gesto que comoveu o mundo e se tornou símbolo de esperança.
Em seus discursos, Francisco apontava frequentemente para a desigualdade e os males do sistema econômico global. “O dinheiro deve servir, não governar”, disse em diversas ocasiões. Suas homilias reiteravam a importância de uma Igreja voltada aos mais pobres, que acolhe sem julgar.
Reformas e avanços, mas também limites
O papa buscou avançar em temas sensíveis dentro da Igreja, como o acolhimento da comunidade LGBTQIA+ e a participação feminina. Permitiu que casais homoafetivos recebessem bênçãos e nomeou mulheres para cargos de maior relevância no Vaticano, inclusive com direito a voto no Sínodo dos Bispos.
Contudo, manteve posições tradicionais em relação à ordenação de mulheres e ao celibato clerical. “Jesus escolheu homens como apóstolos”, justificava. Essas decisões lhe renderam críticas de grupos progressistas, enquanto o conservadorismo eclesiástico também o acusava de minar tradições centenárias.
Um pastor de gestos e presença
Francisco era reconhecido por seu jeito simples e afetuoso. Preferia residências modestas, usava sapatos comuns e dispensava carruagens pomposas. Gostava de caminhar entre os fiéis, de fazer piadas e abraçar as pessoas. Sua conexão com o povo transcendia os muros do Vaticano.
Mesmo com dores no quadril e dificuldade de locomoção nos últimos anos, recusou-se a renunciar. “Estou indo em frente”, disse ao ser questionado sobre o assunto, contrastando com declarações anteriores em que sugerira um pontificado breve. A decisão refletia seu senso de urgência e missão diante de uma Igreja que, segundo ele, precisava “abrir as portas e ir ao encontro”.
O que vem a seguir para a Igreja Católica
Até o momento, o Vaticano não anunciou oficialmente os detalhes do funeral de Francisco nem o cronograma para o novo conclave. A morte do papa abre um novo capítulo para a Igreja, que deve se reunir nas próximas semanas para eleger seu sucessor. O desafio será dar continuidade às reformas e ao espírito de abertura deixados por Francisco, sem perder a identidade doutrinária milenar da instituição.
Em dezembro de 2023, Francisco revelou em entrevista à imprensa mexicana que não queria se enterrado no Vaticano, seu desejo que o sepultamento fosse na Basílica de Santa Maria Maggiore, em Roma. “O local já está preparado. Quero ser sepultado em Santa Maria Maggiore”, na época, revelando que ele já tinha preparado os detalhes do seu enterro e que simplificou o rito, que é particularmente longo.
Enquanto isso, o mundo católico e não católico lamenta a perda de um líder espiritual que, por mais de uma década, rompeu barreiras, desafiou poderes e fez da fé um instrumento de justiça e compaixão.
*Notícia em atualização. Em instantes o Diário de Vacaria estará ampliando.