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Frio, Nutrição e Colostro: O Cuidado Essencial na Pecuária de Inverno

O frio e o cenário atual da pecuária gaúcha

Na tarde gelada desta última segunda-feira, o estúdio do Diário de Vacaria recebeu mais um encontro repleto de informações essenciais para quem vive da pecuária na região dos Campos de Cima da Serra. Enquanto as temperaturas caíam após as chuvas do final de semana, Lucas e Janice Machado, médica veterinária e especialista em bem-estar animal, aprofundaram uma conversa que começou no último episódio e que ganhou contornos ainda mais relevantes com o lançamento do novo Plano Safra.

Frio, Nutrição e Colostro: O Cuidado Essencial na Pecuária de Inverno

Com foco na realidade local, o programa trouxe não apenas notícias em tempo real, mas uma análise ampla do ciclo pecuário, dos cuidados com os animais recém-nascidos e da importância de manter dados atualizados junto às inspetorias veterinárias.

O contexto climático, marcado pelo frio úmido característico da região serrana, também permeou a discussão, principalmente sobre os desafios que ele impõe aos produtores rurais nesta época do ano.

O ciclo pecuário e as perspectivas de preços

A principal referência técnica abordada foi a palestra da economista Lígia Pimentel, da Agrifato, apresentada recentemente no Nespro em Porto Alegre. Janice destacou que a especialista confirmou dados que há algum tempo vinham sendo debatidos: o ciclo pecuário está na iminência de entrar em sua fase de alta.

Embora muitos produtores tenham percebido uma elevação nos preços ao final de 2024, Janice explicou que aquilo foi apenas uma reação pontual de mercado e que o ciclo de valorização efetiva se estenderá até pelo menos 2026. Esse período deve trazer remuneração mais atrativa, tanto no preço do terneiro quanto no boi gordo.

Segundo as projeções apresentadas no evento, a fase de baixa do ciclo pecuário costuma durar aproximadamente três anos, enquanto a de alta se estende por pouco menos de três. Assim, o momento é oportuno para o produtor se preparar, fazer planejamento financeiro e garantir que o rebanho esteja em condições sanitárias e nutricionais ideais, de forma a aproveitar ao máximo essa valorização prevista.

Os desafios climáticos e a importância da gordura marrom

A conversa evoluiu para uma questão delicada: os nascimentos que ocorrem nesta época do ano, sob frio intenso e umidade alta. Janice ressaltou que muitas propriedades fazem coincidir a estação reprodutiva com o período de inverno, aproveitando melhor as pastagens frias, mas que isso requer atenção redobrada.

Ela explicou que a sobrevivência dos terneiros e cordeiros nas primeiras horas de vida depende de um fator fisiológico chamado gordura marrom, produzida ainda durante a gestação. Essa gordura rica em mitocôndrias é a principal responsável por garantir calor aos neonatos. Porém, sua quantidade e eficiência estão diretamente relacionadas ao estado nutricional da matriz no pré-parto.

Em rebanhos com deficiências alimentares, a chance de nascimento de animais fracos e com menor reserva energética aumenta, elevando a mortalidade, principalmente nas primeiras 72 horas. Esse dado é alarmante e tem reflexo direto nos índices estaduais: a mortalidade de cordeiros ainda gira em torno de 30% a 35% no Rio Grande do Sul, segundo Janice.

A relevância do colostro e a janela crítica das primeiras horas

Outro ponto essencial da entrevista foi o papel do colostro. Ao contrário do leite convencional, o colostro é uma substância altamente rica em imunoglobulinas, proteínas de alto peso molecular que funcionam como a primeira vacina natural dos ruminantes.

Janice detalhou que, ao nascer, as células da parede estomacal do terneiro ainda estão afastadas, permitindo a absorção dessas imunoglobulinas. No entanto, essa capacidade diminui rapidamente, pois as células se tornam justapostas. Por isso, o ideal é que a ingestão aconteça até a sexta hora de vida, embora ainda seja possível alguma absorção até as 24 horas.

Essa janela curta faz com que a atenção no manejo logo após o parto seja decisiva. Animais que não mamam colostro a tempo podem não só ter dificuldade em manter a temperatura corporal como também ficar vulneráveis a doenças e infecções que comprometem todo o ciclo produtivo.

A declaração anual de rebanho e o retrato da pecuária gaúcha

A entrevista também trouxe à tona a relevância administrativa da declaração anual obrigatória do rebanho, cujo prazo se encerrava em 30 de junho. Muitos produtores ainda encaram essa obrigação como burocracia, mas ela é um pilar para o funcionamento de políticas públicas, fiscalização sanitária, liberação de vacinas e até linhas de crédito rural.

Quando o produtor declara seus dados corretamente, o sistema estadual atualiza automaticamente os números a cada movimentação registrada via GTA (Guia de Trânsito Animal). Essas informações alimentam relatórios que revelam, por exemplo, quantos animais foram abatidos, quantos nasceram e qual a estrutura etária do rebanho.

Segundo Janice, a confiabilidade desses números impacta também nas compras de vacinas obrigatórias, como a de brucelose em fêmeas entre três e oito meses. Se o produtor omite ou registra de forma equivocada a quantidade de terneiras, ele pode, inclusive, ser impedido de adquirir doses suficientes.

Tecnologia e planejamento como diferenciais competitivos

Durante o programa, Lucas e Janice reforçaram que, embora alguns dados e processos possam parecer óbvios para parte dos produtores, muitos ainda não possuem organização mínima em suas propriedades. A escrituração zootécnica — seja em software, planilha ou caderno — faz diferença concreta nos resultados produtivos e financeiros.

O planejamento adequado inclui o controle da estação reprodutiva, o registro das categorias dos animais, o acompanhamento nutricional das matrizes e até o dimensionamento da mão de obra. Como exemplificou Janice, ao manter uma estação de parição curta, o produtor pode contratar ajuda temporária apenas nos meses críticos, otimizando custos e garantindo atenção devida aos recém-nascidos.

Ela comentou sobre exemplos internacionais, como na Nova Zelândia, onde há contratação sazonal de mão de obra qualificada para acompanhar os partos, algo que, se adaptado, poderia contribuir muito para reduzir perdas no Brasil.

O ciclo da eficiência e o ano novo pecuário

Com o início do chamado “ano novo pecuário”, no dia 1º de julho, a mensagem principal foi de incentivo a quem ainda não planejou a próxima safra de nascimentos e de produção. Janice reforçou que, mesmo neste estágio, ainda há tempo de organizar rotinas, avaliar índices reprodutivos, planejar compras de insumos e ajustar o calendário produtivo.

A eficiência não nasce da noite para o dia, mas de uma sequência de decisões pequenas e bem estruturadas. Conforme destacou Lucas, a organização também facilita o entendimento do fluxo financeiro e a projeção de receitas e despesas. A própria obtenção de linhas de crédito depende de dados coerentes entre declaração de rebanho e as finalidades descritas no projeto de financiamento.

Contexto local e compromisso com a informação de qualidade

Por fim, os apresentadores destacaram que, apesar de o noticiário agropecuário frequentemente repercutir análises de outras regiões, como São Paulo ou Mato Grosso, é fundamental dar visibilidade à realidade local. O clima úmido da serra, as pastagens de inverno e o perfil das propriedades familiares formam um cenário singular que exige cuidados específicos.

O compromisso do Diário do Agronegócio é justamente trazer esse conhecimento técnico, atualizado e contextualizado, para que o produtor de Vacaria e dos Campos de Cima da Serra tenha embasamento confiável para tomar decisões.

A entrevista encerrou com o convite para que os ouvintes participem com perguntas e sugestões de temas, reforçando que o desenvolvimento da pecuária regional passa por informação, profissionalismo e planejamento.

Agronegócio, Agropecuária, Campos de Cima da Serra, Pecuária, Rio Grande do Sul, Vacaria

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