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Do Genoma ao Prato: Como a Pecuária Gaúcha se reinventa nos Campos de Cima da Serra

No estúdio do Diário de Vacaria, um episódio do podcast reuniu dois grandes nomes da pecuária do Rio Grande do Sul: Carlos Simm, da Fazenda Clarice, e João Ernani Duarte, da histórica Fazenda Capão Alto. O encontro resgatou não apenas lembranças e registros da trajetória da bovinocultura regional, mas também expôs as novas tecnologias e estratégias que estão moldando o futuro da produção de carne de qualidade nos Campos de Cima da Serra.

Do Genoma ao Prato: Como a Pecuária Gaúcha se reinventa nos Campos de Cima da Serra

Com raízes profundas na tradição pecuarista, os convidados mostram que, para prosperar, o setor precisa aliar herança e inovação. A história das famílias envolvidas remonta ao século XVIII, com sete gerações de trabalho contínuo no campo. No entanto, o destaque atual se dá pela capacidade de adaptação às demandas de um consumidor cada vez mais exigente.

A origem do Cite e a construção de uma rede de conhecimento

O movimento de profissionalização teve um marco em 1997, com a criação do grupo Cite120 — uma versão local dos chamados “Sítios”, que promovem integração e troca de experiências entre pecuaristas. Inspirado nos modelos de 1974 e 1984 no Rio Grande do Sul e Federacite, respectivamente, o Cite120 mantém encontros mensais há 27 anos, focados na gestão técnica das propriedades, troca de saberes e planejamento coletivo.

João Ernani Duarte foi um dos responsáveis por reativar esse formato em Vacaria após experiências no Mato Grosso e no Sindicato Rural. A proposta foi clara desde o início: nada de encontros informais aos fins de semana com bebidas. Os encontros seriam durante a semana, com seriedade, troca de ideias e foco na melhoria contínua.

Carlos Simm, também fundador do Cite120, destaca que a experiência acumulada nesse grupo foi determinante para avanços posteriores, como a fundação da Aproccima, a Associação dos Produtores dos Campos de Cima da Serra.

Aproccima: unindo elos e fortalecendo a cadeia

A Aproccima nasceu da necessidade de integrar os diferentes segmentos da cadeia produtiva da carne. Na visão de Carlos, o maior gargalo do agronegócio é a desorganização entre produtor, indústria e varejo. “Quando um elo está fragilizado, toda a cadeia sofre”, resume.

A solução encontrada foi criar uma estrutura que proporcionasse ganhos mais equilibrados entre todos os envolvidos. Hoje, a Aproccima atua com sete unidades de negócio, incluindo a produção, a indústria frigorífica e o varejo. Um dos resultados práticos dessa organização é a loja Estância do Assador, em Caxias do Sul — mais que uma casa de carnes, um verdadeiro ponto de conexão entre o campo e o consumidor.

Certificações e rastreabilidade: do campo ao garfo com transparência

Entre os principais diferenciais da carne comercializada pela Aproccima está a certificação em boas práticas agropecuárias, concedida pela Embrapa e auditada com 122 pontos de verificação. Desde 2013, sete propriedades da associação ostentam esse selo, que garante procedência, sustentabilidade e responsabilidade socioambiental.

Além disso, a Aproccima mantém um sistema completo de rastreabilidade. Cada peça de carne que chega ao consumidor tem registrada sua origem: raça, idade, sexo, tipo de alimentação e sistema de terminação. As informações são visíveis na loja física e no site da associação. “É uma forma de respeito ao consumidor e valorização do nosso trabalho no campo”, explica Carlos.

Genética de precisão: a revolução do genoma na pecuária

João Ernani Duarte trouxe à conversa a expertise genética da Fazenda Capão Alto. Desde 1977, a família mantém uma cabanha especializada na produção de animais puros, mas com um diferencial: adaptados ao campo e selecionados por características invisíveis a olho nu.

Com o uso de testes genéticos, é possível identificar 17 características no DNA dos animais — entre elas, maciez, marmoreio, ganho de peso e produção de leite.

As três tendências da carne premium

A Estância do Assador trabalha com três linhas de carne voltadas a diferentes perfis de consumo:

  1. Aproxima Gourmet: com foco na maciez, seleciona animais com pontuação genética 8, 9 ou 10 para essa característica.
  2. Aproxima Prestígio: privilegia o marmoreio, resultando em carnes visualmente atrativas e extremamente suculentas.
  3. Aproxima Sabor Serrano: valoriza o sabor, geralmente encontrado em vacas de descarte com idade mais avançada, mas alto valor gustativo.

Essa segmentação permite explorar todo o potencial da genética e da alimentação animal, além de criar novas oportunidades no varejo.

Nutrição e ambiente: o que o boi come, o consumidor sente

Uma das revelações mais interessantes do programa foi a relação entre a alimentação do gado e o sabor da carne. Como explicou João, “não alimentamos a vaca, alimentamos as bactérias do rúmen”. Cada tipo de forragem gera diferentes fermentações, o que explica por que o queijo artesanal serrano, por exemplo, tem sabor único — são mais de 600 espécies de gramíneas e leguminosas naturais na região.

A carne segue o mesmo princípio: a diversidade do pasto e os microelementos adicionados à dieta se refletem diretamente no sabor final. Essa lógica permite, inclusive, a diferenciação regional da carne gaúcha, podendo levar a futuras indicações geográficas, como já ocorre com o queijo serrano.

Cortes e cursos: educação para valorizar o que se produz

Na loja Estância do Assador, o consumidor encontra 114 tipos diferentes de corte, todos com explicações sobre origem, preparo e características sensoriais. Para ajudar a popularizar esse conhecimento, Carlos organiza cursos com módulos específicos — da anatomia do corte à degustação, passando por preparo com chefs especializados.

Essas ações formativas têm o objetivo de construir um consumidor mais informado e exigente, que valorize o produto regional e o trabalho do pecuarista gaúcho.

Hambúrguer de vaca velha: sabor que surpreende

Entre as experiências compartilhadas, uma se destacou: o preparo de hambúrgueres com carne de uma vaca de descarte, de longa vida produtiva, mas com alto índice de maciez e sabor. A comparação com hambúrgueres de novilhas precoces surpreendeu: “a vaca ganhou de lavada”, relatou Carlos.

A experiência reforça a importância da rastreabilidade e do genoma: mesmo animais fora do padrão comercial comum podem render carnes de altíssimo valor gastronômico.

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